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Os desafios que empresas e entidades enfrentarão com a nova plataforma de boletos bancários
Contagem regressiva para validação da nova plataforma de boletos bancários, com cronograma inicial definido para 13 de março desse novo ano, e muita insegurança para empresas e entidades em relação aos custos e aos desafios operacionais que estão por vir.
Como é sabido a Federação Brasileira dos Bancos (FEBRABAN) junto à rede bancária vem desenvolvendo uma nova plataforma de cobrança, motivada pelo prejuízo financeiro proporcionado por fraudes.
Assim, com fundamento nas Circulares de nºs 3.461/09, 3.598/12 e 3.656/13, todas do Banco Central, o sistema foi revisto e será atualizado gradativamente, em ondas de valores, conforme informação da própria FEBRABAN, que inclusive disponibilizou em seu portal uma Cartilha para orientar a todos, na qual consta além de perguntas e respostas uma tabela indicando datas e faixas de valores para validação dos boletos, cujo início será em 13/03/2017 para validação dos boletos de valores iguais ou superiores a R$ 50.000,00, e em 11/12/2017, início da validação dos boletos com valores até R$ 200,00, sendo esta a última etapa de implantação do sistema que deve ser concluída ainda em 2017.
Vale lembrar que é competência do Banco Central fiscalizar as instituições financeiras, além de exercer permanente vigilância nos mercados financeiros e de capitais. As novas medidas consistem, assim, na modernização e facilitação para esse fim, implicando no registro de boletos bancários, e na coleta de informações indispensáveis para sua emissão em determinados casos.
Mas como irá funcionar exatamente esse novo sistema?
Para melhor entendimento é importante conhecer os atores dessa operação. Nos termos das circulares, serão quatro papéis: (a) beneficiário, que é o credor da dívida em cobrança; (b) pagador, o devedor da dívida em cobrança; (c) instituição financeira recebedora, que é a instituição financeira que receberá os fundos do pagador; e (d) instituição financeira destinatária, que será a instituição financeira contratada pelo beneficiário.
É preciso compreender também que existirão duas formas de boletos registrados que são: (a) boleto de cobrança, utilizado para cobrança de dívidas decorrentes de obrigações de qualquer natureza; e, (b) boleto proposta, utilizado para possibilitar o pagamento decorrente de eventual aceitação de uma oferta de produtos e serviços.
Em relação ao boleto de cobrança o beneficiário firmará contrato com uma instituição financeira de sua preferência e emitirá o boleto com todos os seus dados, como nome, CNPJ e valor da obrigação, informações que são obrigatórios nos termos das circulares, além do nome do pagador.
A exigência do CPF ou do CNPJ do pagador, embora deva constar do boleto por exigência de configuração de sistema, não está descrita nas circulares.
Esse boleto poderá ser pago em qualquer banco, mesmo que esteja vencido. A atualização do boleto será realizada por sistema também.
Aqui convém destacar que o boleto não registrado ainda poderá ser emitido, porém o seu pagamento só poderá ser feito na instituição financeira beneficiária, e neste caso, mesmo que o vencimento não tenha acontecido, como uma forma de estimular o uso da nova plataforma.
Para a modalidade de boleto registrado o beneficiário poderá ajustar com a instituição financeira o seu protesto automático em caso de inadimplemento. Aqui tem início os dilemas das empresas e até das entidades.
O custo dos serviços de cobranças pela nova plataforma é uma das questões.
O setor de e-commerce, por exemplo, externou grande preocupação em relação ao novo sistema de cobrança. Indicadores do setor revelam que em torno de 50% (cinquenta por cento) das compras online são canceladas, o que encarecerá demasiadamente o custo operacional do negócio, especialmente porque a cobrança da taxa de emissão do boleto do consumidor é considerada prática abusiva, entendimento que é dominante no âmbito do Poder Judiciário.
Para a Justiça, esse custo integra o processo de gestão do produto ou do serviço, o que, em última análise, encarecerá o próprio produto ou serviço oferecido.
Para as entidades sindicais esse custo também gera receio, pois a cada dia a resistência aos recolhimentos previstos em lei é maior.
O segundo ponto de preocupação refere-se ao prazo do beneficiário para autorizar o protesto pela instituição beneficiária, que é o banco contratado, medida que passará a ser automática.
Não há previsão legal em relação ao prazo para o protesto quando o título não é pago, sendo possível, em tese, que a medida seja tomada no dia seguinte ao do inadimplemento. Contudo, é preciso haver bom senso. Muito embora uma dívida possa ser alcançada pela prescrição, o que impediria sua cobrança, o credor deve lembrar que a confirmação do pagamento pode não acontecer no dia subsequente ao do vencimento do boleto, além das falhas de sistema que eventualmente ocorrem.
Portanto, é recomendável a negociação com o banco para definição de um prazo razoável, de 3 (três) meses, talvez, para que o protesto aconteça automaticamente.
Ainda sobre o protesto automático outro ponto poderá gerar desgastes para o credor.
Trata-se dos requisitos de um título executivo. O boleto bancário, puro e simples, não constitui título executivo, logo, em tese, não poderia ser protestado a rigor da Lei 9.492/1997, que estabelece que o “protesto é ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida”.
Essa é a Lei de protestos e que exige o título juntamente com outros documentos da dívida, como o contrato. A operação automática naturalmente fugirá a essa regra. Em relação aos títulos de crédito, são inúmeras as modalidades previstas em diferentes leis dentre as quais o boleto bancário não está inserido.
Por outro lado um precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ameniza essa questão. No Recurso Especial 1024691, sob a relatoria da ministra Nancy Andrighi, houve a admissão do protesto do que se convencionou chamar de duplicatas virtuais, que são os boletos bancários.
Para a ministra “a prática mercantil aliou-se ao desenvolvimento da tecnologia e desmaterializou a duplicata, transformando-a ‘em registros eletromagnéticos, transmitidos por computador pelo comerciante ao banco. O banco, por seu turno, faz a cobrança mediante expedição de simples aviso ao devedor – os chamados boletos, de tal sorte que o título em si, na sua expressão de cártula, surge se o devedor se mostrar inadimplente".
De qualquer forma, não é raro que as instâncias inferiores emitam pareceres contrários fomentando o ambiente de insegurança jurídica a que o Brasil está acostumado, infelizmente.
Especificamente em relação às entidades sindicais, das espécies de cobranças possíveis, previstas em lei, poderá ser um transtorno ainda maior a cobrança da contribuição assistencial devido a constante discussão quanto à sua natureza jurídica.
Vale lembrar que são quatro as espécies de contribuições sindicais: sindical, confederativa, assistencial e associativa.
A sindical tem natureza tributária reconhecida inclusive pelo Supremo Tribunal Federal e, portanto, não está sujeita às novas regras do Banco Central, assim como outros tributos devidos a órgãos públicos, bem como os serviços oferecidos por concessionárias.
Das quatro espécies a associativa seria a única contribuição de caráter voluntário, até a adesão à entidade – vale frisar, momento a partir do qual o associado se obrigaria a essa e a outras condições. Assim, a associativa estaria sujeita às novas regras de cobrança.
A dúvida permanece em relação às contribuições confederativa e assistencial. Em tese, são contribuições de caráter compulsório e que atenderiam a uma coletividade específica, uma categoria. No entanto, diversas discussões judiciais ocasionaram precedentes que têm de ser considerados.
A contribuição confederativa, por exemplo, encontra obstáculo na súmula 666, do Supremo Tribunal Federal (STF), que restringe a cobrança apenas aos associados, lá tratados indevidamente como filiados. Como se vê o entendimento do Supremo conferiu a esta contribuição o mesmo status da contribuição associativa, o que a sujeitaria ao novo sistema de boletos nessa perspectiva.
A assistencial segue numa linha semelhante, enfrentando precedentes judiciais no sentido de que se trataria de contribuição exigível somente dos filiados, muito embora a categoria em peso se beneficie com os resultados alcançados nas negociações coletivas, destino desses recursos.
A diferença, entretanto, está na controvérsia em aberto sobre sua exigibilidade de toda a categoria. Sendo uma taxa exigível de todos da categoria, como de fato o é, não se sujeitaria às novas regras do banco central, pois não se trataria de um boleto decorrente de uma contratação direta, comum, mas de um cumprimento legal. Uma obrigação “sui generis” estabelecida de forma peculiar.
Todavia, considerando a sujeição da contribuição assistencial à nova plataforma de cobrança às entidades é recomendável cautela na contratação dos protestos automáticos justamente porque a temática é conflitante no âmbito do Judiciário, o que poderá gerar maiores ônus para os sindicatos.
O valor que deve ser gravado no boleto constitui mais um elemento de atenção para as entidades, mais do que para as empresas. As circulares do Banco Central determinam que seja expresso um valor, mas, pensando naquelas que captam recursos a título de doações permitiu a configuração de valor zero com faixas mínimas e máximas para pagamento. Por exemplo, o boleto deverá prever um pagamento mínimo de R$ 10,00 e máximo de R$ 100,00.
Entendemos que este será o caminho para as entidades emitirem seus boletos para contribuições assistenciais, especialmente porque existem diferentes regras de recolhimento, ora baseada no faturamento da empresa, ora no número de empregados, dentre outras fórmulas e que dependem de informações retidas com o pagador.
Por fim, o sistema de cobrança em si é outro aspecto que atormenta empresas e entidades. Muitas já investiram significativas quantias em sistemas próprios de emissão de boletos e agora se verão obrigadas a no mínimo ajustarem-se a tal plataforma, que até permitirá a utilização de sistema próprio, desde que esse atenda às peculiaridades necessárias que possibilite a interação com a nova plataforma.
Pertinente ao boleto de proposta, aquele transmitido ao potencial cliente com o objetivo de ofertar um produto ou um serviço, as empresas deverão se ater às novas regras previstas nas Circulares do Banco Central.
Primeiramente, a emissão e transmissão do boleto de proposta estão condicionadas à autorização prévia, pelo eventual pagador, que deverá manifestar sua vontade em receber este tipo de boleto, cumprindo à empresa o armazenamento do registro que comprova a autorização do envio.
Ainda assim, o pagamento será facultativo, e o prazo de aceitação da proposta será o mesmo do vencimento do boleto. Nos termos das Circulares, o boleto de proposta terá um formato específico com campo próprio para que as empresas expressem de forma clara a facultatividade no seu pagamento.
No mais, é certo que o assunto não se esgota com os pontos acima e nem era essa a intenção do artigo. Apenas dar continuidade a um debate que ainda demandará muita discussão até que empresas, entidades e pagadores ajustem-se à nova realidade. Dúvidas, sugestões ou críticas entre em contato conosco através do e-mail lazaro.sa@saadv.adv.br ou informação@saadv.adv.br .
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